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O coronavírus fez mais uma vítima: a privacidade

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É incontestável que a atual pandemia transformou radicalmente a maneira como vivemos. A tragédia humana é incontestável, muitas pessoas foram contaminadas, algumas se curaram outras acabaram por falecer. Tudo indica que a economia global também vai sofrer impactos com a doença. Mas uma coisa que ainda não ganhou muito espaço no noticiário é que o coronavírus fez mais uma vítima: a privacidade.

Em um mundo racional e perfeito poderíamos pensar que a experiência com essa pandemia nos levaria à uma maior união entre as nações, unindo esforços para evitar que uma situação como essa venha a acontecer novamente e para também juntos mitigar os efeitos negativos da pandemia que estamos vivendo. Mas a realidade é que o mundo não é muito racional, e está longe de ser perfeito.

O que está acontecendo:

A Wikipedia já tem uma página inteira dedicada a narrar incidentes de xenofobia e racismo relacionados ao coronavírus que já aconteceram em todos os continentes do globo (veja aqui). O primeiro ministro húngaro, Viktor Orbán, recentemente anunciou: “estamos lutando uma batalha dupla: um fronte é chamado migração, o outro diz respeito ao coronavírus. Existe uma ligação clara entre os dois, uma vez que ambos se espalham com o movimento”. Nada racional, muito menos perfeito.

O autor de A Era do Capitalismo de Vigilância (em tradução livre) Shoshana Zuboff comentou que até pouco antes do início da pandemia o governo americano estava levando realmente a sério a criação de regulamentações dando mais controle às pessoas acerca de seus dados e portanto enfraquecendo as companhias que coletam e analisam estes dados. Porém, em questão de dias a abordagem mudou e a ideia agora é entender como proteger e fomentar essas companhias. Aquilo que em uma situação normal pode parecer bizarro, em se tratando de uma pandemia pode soar bastante razoável, e é aí que mora o perigo.

Image by Gerd Altmann from Pixabay

Vidas expostas:

Segundo o jornal britânico The Guardian, hoje em dia na China (um regime autoritário) drones estão sendo usados para monitorar as pessoas. E caso encontrem alguma pessoa que não esteja usando máscara utilizam auto falantes para passar mensagens, gravadas pela polícia, e reforçar a necessidade do uso. A vida por lá começa a voltar ao normal, após um longo período de quarentena. Porém, a fronteira segue fechada, uma vez que os novos casos, ainda aparecendo agora, vinham trazidos por quem estava fora do país.

Leia também:

Ainda segundo o jornal, a Alemanha, Austria, Itália e Bélgica (todos regimes democráticos) estão fazendo uso de dados capturados por operadoras de telefonia celular para monitorar o movimento das pessoas. Em Israel, a agência de segurança nacional agora tem acesso a todo o histórico de dados dos celulares de pessoas infectadas. Na Coréia do Sul o governo está enviando mensagens de texto para pessoas identificando indivíduos que estejam potencialmente infectados e alertando os demais sobre onde ele esteve.

Qual o limite de acesso aos nossos dados?

É compreensível que os governos estejam tomando essas medidas drásticas, mas é bastante preocupante pensar que esse tipo de coleta de dados se tornará o padrão daqui em diante. O problema maior é que hoje todos esses dados são coletados por empresas em nome de governos atuando em prol da saúde pública. Amanhã, no entanto, o motivo muda rapidamente, meio que sem ninguém perceber. E assim, o que começou em uma situação extraordinária para socorrer a saúde pública, acabará ganhando uma utilidade totalmente nova. Acabará se mesclando em nosso cotidiano e assim mais um pouquinho da privacidade que ainda tínhamos se vai.

Em um futuro não muito distante, conforme a demanda por esses dados começar a escalar (lembrando que em nome de causas nobres como a saúde ou a segurança nacional) vai se tornar cada vez mais difícil parar esse movimento. E assim como aconteceu pós 11 de setembro, mais um pouco da privacidade será sacrificado em nome de algo considerado maior.

Image by StockSnap from Pixabay

Mas afinal, isso está certo ou errado?

Talvez estejamos diante de uma situação filosófica onde de fato não exista o certo e o errado. Alguns podem defender que tudo é válido em nome do combate à pandemia. Já outros podem defender que não podemos abrir precedentes e violar garantias constitucionais em nome de qualquer coisa que seja. Argumentos lógicos e racionais são possíveis para ambos os lados, mas, contudo, uma conclusão para essa discussão é bastante improvável.

O casamento entre medidas restritivas de liberdade (quarentena) com essas medidas restritivas de privacidade vem acontecendo ao redor de todo o planeta, não importando o regime adotado por cada país, conforme pudemos ver. Tal combinação é sem precedentes em tempos de paz, e as possíveis consequências ainda não sabemos, mas talvez sejam um bom tema para um próximo texto.

Em um ensaio sobre a ética Mario Sérgio Cortella disse: “Temos paz de espírito quando aquilo que queremos é o que podemos e é o que devemos”. Em termos práticos não tem muito que possamos fazer para mudar o que está acontecendo. Nos resta, então, desejar que quem quer que esteja tomando estas decisões tenha muita paz de espírito.

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Esperamos que este artigo tenha sido esclarecedor para você. Estamos formando uma legião de empreendedores bem-sucedidos, vamos juntos?

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Afonso Pimenta

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